Um outro canto da madrugada
Luz. Sábado. 03:00
da manhã. Bar do Alves. Um homem entre seus vinte e poucos anos esvazia o quarto copo de Jurupinga; Corte de cabelo militar um tanto crescido; era alto,
forte e a barba estava por fazer, usava um blusão vermelho com uma jaqueta de motoqueiro
por cima, a mochila em suas costas pesava muito; Encostado em sua cadeira havia
um estojo de violão.
Ele pagou a conta
e saiu do estabelecimento com seus pertences, parando apenas para dar passagem
para um casal que vinha chegando, o rapaz carregava duas mochilas e a moça de
cabelos castanhos que o acompanhava parecia bem abatida.
Do bar, o homem
fez seu caminho até o metrô; Ao adentrar no penúltimo vagão ele deixou que o
cansaço o alcançasse e se jogou no banco mais próximo. Se deixando devanear,
voltando aos acontecimentos da noite anterior. De inicio não ouviu nada, logo o
som alto da boate o atinge, e ele retorna à Armênia horas atrás.
(...)
Uma
garrafa de uísque estoura em seu rosto, não havia problema nisso já que ele
usava uma carranca chinesa, vermelho berrante com detalhes em amarelo, sua
armação possibilitava que ela fosse levantada como uma viseira. Usava uma
camiseta preta e um pesado colete à prova de balas. Em ambas as mãos enluvadas
em malha preta zuniam catanas afiadas.
A
calça cargo cinza escuro já estava escarlate de sangue, enquanto executava mais um
movimento circular com o braço esquerdo e incapacitava outro inimigo com um
corte fundo no tórax. O ambiente era a definição do caos. Mulheres seminuas
gritavam e corriam enquanto mais seguranças se lançavam ao mascarado no palco, sendo rechaçados pelas
catanas que zuniam pelo ar, cortando o vento.
O
mascarado retalhou o primeiro atacante com um corte no ombro e se agachou para
finaliza-lo com um corte na cocha. se levantou e chutou o inimigo derrotado
para o lado, pronto para o ataque do segundo que investiu com um porrete, o
golpe veio de cima para baixo e foi aparado pelas lâminas japonesas cruzadas,
defletindo a força do golpe para o lado e girando mais uma vez para cortar seu
adversário, que tinha perdido a guarda.
Outro
segurança apareceu armado, fazendo o vigilante se atirar para fora do palco e
ir ao chão meio metro abaixo, seguido pelo pente da 9mm. Enquanto o sujeito procurava outro pente nos bolsos do terno e
nas calças, a figura fantástica reapareceu no palco com as catanas. Sem saída, o segurança lançou a arma no mascarado
e partiu para um soco no rosto, sua mão encontrou a dura carranca chinesa. O
vigilante recebeu o impacto e revidou com uma cabeçada, se agachou e cruzou as
espadas, descruzando-as nos joelhos do segurança ainda desorientado, fatiando
seus ligamentos. Quando se levantou sentiu uma dor latente no ombro, onde outro
homem havia acabado de cravar uma faca.
O
rapaz por trás da carranca transformou o urro de dor em raiva enquanto girava o
corpo e a catana em sua mão direita, atingindo o sujeito na altura do umbigo,
rasgando seu abdome na horizontal. Apesar da confusão e da maioria dos clientes
e funcionários ter ido embora, a música continuou, deixando que as luzes
psicodélicas iluminassem a carnificina abaixo. Quando se deu conta que já tinha
passado por cima de todos os empregados do dono do estabelecimento, ele se
permitiu relaxar; retirando a faca do ombro.
Subiu
ao segundo andar da boate, na área dos “eventos privados”, chegou à ultima
porta no fim do corredor, a mais chamativa, em que se lia “Direção”. Abriu a porta devagar, quando entrou ficou
sem reação. O homem que procurava jazia à sua frente, sentado atrás de uma
grande mesa de carvalho; Morto, o corte profundo em sua garganta não abria
espaço para dúvidas. Atrás dele, na janela, encontrava-se uma mulher loira, de
mais ou menos 1.70 de altura, vinte e poucos anos. Assim como ele, ela parecia
comemorar o carnaval fora de época.
Ela
se virou devagar, com um sorriso de desdém. Usava uma máscara laranja que lhe
cobria os olhos, ornada com ângulos que iam até as bochechas, o resto do
vestuário era laranja e preto para contrastar propositalmente com a máscara. Um
colete de inverno, uma camiseta com mangas compridas que ela arregaçou até o
cotovelo e luvas para que não houvesse digitais; Nada espalhafatoso, ele se
sentiu meio idiota de usar um figurino tão teatral.
- Tá legal... você não é da segurança! – Apesar
de determinada, parecia enfrentar com certo choque o que fizera.
Da
Yu guardou as catanas nas bainhas, ambas presas nas costas dele, repousadas na
diagonal. Olhou para a garota, decidiu que ela realmente não apresentava muito
perigo, mas deixou os ouvidos trabalharem em qualquer movimento vindo das escadas.
- Cê tem noção de como foi difícil entrar
aqui com duas catanas, passar por todo aquele lixo... pra no fim nem falar com
o cara? – O rapaz por trás da carranca começou seu desabafo irado, mesmo sem
mexer a boca, congelada naquele eterno sorriso de dentes afiados.
- O que de tão importante você teria pra
conversar com ele? É só mais um bicheiro ligado com o crime organizado. Esses
têm de monte! – A garota respondeu, o examinando.
- O infeliz tinha um carregamento de coca dos
grandes saindo da Sé hoje à noite, eu ia interrogar o cara pra descobrir onde
era! – O rapaz retrucou, enfezado; e não para menos.
- Olha... que tal a gente esquecer isso e
sair daqui? Que diferença faz esse carregamento de coca agora? – Ela
desconversou, mas decidiu ali qual seria seu próximo passo. trabalhar para
descobrir sobre o carregamento da Sé. – E sabe o que mais... É legal conhecer
alguém do ramo logo de cara! “Rouxinol”. – Ela apresentou o nome do pequeno
pássaro como seu codinome e abriu a janela. Já ia saltar para a laje vizinha, mas
esperou para ver a resposta da carranca, que olhava para o relógio na parede
marcando duas horas da manhã.
O rapaz olhou para ela, empoleirada no
parapeito e respondeu – Da Yu. – Então virou as costas e foi em
direção à porta, “Rouxinol” sorriu e saltou do edifício. Cansado, o jovem
guardou seus pertences e as catanas, separadas; em uma mochila para violão e saiu
da boate, ouvia sirenes atrás dele, mas só pensava em como sua garganta estava
seca.
Ler - Capítulo I