terça-feira, 27 de outubro de 2015

A Vigília da Meia-Noite - Capítulo II

     

Um outro canto da madrugada





      Luz. Sábado. 03:00 da manhã. Bar do Alves. Um homem entre seus vinte e poucos anos esvazia o quarto copo de Jurupinga; Corte de cabelo militar um tanto crescido; era alto, forte e a barba estava por fazer, usava um blusão vermelho com uma jaqueta de motoqueiro por cima, a mochila em suas costas pesava muito; Encostado em sua cadeira havia um estojo de violão.
    Ele pagou a conta e saiu do estabelecimento com seus pertences, parando apenas para dar passagem para um casal que vinha chegando, o rapaz carregava duas mochilas e a moça de cabelos castanhos que o acompanhava parecia bem abatida.
      Do bar, o homem fez seu caminho até o metrô; Ao adentrar no penúltimo vagão ele deixou que o cansaço o alcançasse e se jogou no banco mais próximo. Se deixando devanear, voltando aos acontecimentos da noite anterior. De inicio não ouviu nada, logo o som alto da boate o atinge, e ele retorna à Armênia horas atrás.

(...)


                 Uma garrafa de uísque estoura em seu rosto, não havia problema nisso já que ele usava uma carranca chinesa, vermelho berrante com detalhes em amarelo, sua armação possibilitava que ela fosse levantada como uma viseira. Usava uma camiseta preta e um pesado colete à prova de balas. Em ambas as mãos enluvadas em malha preta zuniam catanas afiadas.
                A calça cargo cinza escuro já estava escarlate de sangue, enquanto executava mais um movimento circular com o braço esquerdo e incapacitava outro inimigo com um corte fundo no tórax. O ambiente era a definição do caos. Mulheres seminuas gritavam e corriam enquanto mais seguranças se lançavam ao mascarado no palco, sendo rechaçados pelas catanas que zuniam pelo ar, cortando o vento.
                O mascarado retalhou o primeiro atacante com um corte no ombro e se agachou para finaliza-lo com um corte na cocha. se levantou e chutou o inimigo derrotado para o lado, pronto para o ataque do segundo que investiu com um porrete, o golpe veio de cima para baixo e foi aparado pelas lâminas japonesas cruzadas, defletindo a força do golpe para o lado e girando mais uma vez para cortar seu adversário, que tinha perdido a guarda.
                Outro segurança apareceu armado, fazendo o vigilante se atirar para fora do palco e ir ao chão meio metro abaixo, seguido pelo pente da 9mm. Enquanto o sujeito procurava outro pente nos bolsos do terno e nas calças, a figura fantástica reapareceu  no palco com as catanas. Sem  saída, o segurança lançou a arma no mascarado e partiu para um soco no rosto, sua mão encontrou a dura carranca chinesa. O vigilante recebeu o impacto e revidou com uma cabeçada, se agachou e cruzou as espadas, descruzando-as nos joelhos do segurança ainda desorientado, fatiando seus ligamentos. Quando se levantou sentiu uma dor latente no ombro, onde outro homem havia acabado de cravar uma faca.
                O rapaz por trás da carranca transformou o urro de dor em raiva enquanto girava o corpo e a catana em sua mão direita, atingindo o sujeito na altura do umbigo, rasgando seu abdome na horizontal. Apesar da confusão e da maioria dos clientes e funcionários ter ido embora, a música continuou, deixando que as luzes psicodélicas iluminassem a carnificina abaixo. Quando se deu conta que já tinha passado por cima de todos os empregados do dono do estabelecimento, ele se permitiu relaxar; retirando a faca do ombro.
                Subiu ao segundo andar da boate, na área dos “eventos privados”, chegou à ultima porta no fim do corredor, a mais chamativa, em que se lia “Direção”.  Abriu a porta devagar, quando entrou ficou sem reação. O homem que procurava jazia à sua frente, sentado atrás de uma grande mesa de carvalho; Morto, o corte profundo em sua garganta não abria espaço para dúvidas. Atrás dele, na janela, encontrava-se uma mulher loira, de mais ou menos 1.70 de altura, vinte e poucos anos. Assim como ele, ela parecia comemorar o carnaval fora de época.
                Ela se virou devagar, com um sorriso de desdém. Usava uma máscara laranja que lhe cobria os olhos, ornada com ângulos que iam até as bochechas, o resto do vestuário era laranja e preto para contrastar propositalmente com a máscara. Um colete de inverno, uma camiseta com mangas compridas que ela arregaçou até o cotovelo e luvas para que não houvesse digitais; Nada espalhafatoso, ele se sentiu meio idiota de usar um figurino tão teatral.
- Tá legal... você não é da segurança! – Apesar de determinada, parecia enfrentar com certo choque o que fizera.
                Da Yu guardou as catanas nas bainhas, ambas presas nas costas dele, repousadas na diagonal. Olhou para a garota, decidiu que ela realmente não apresentava muito perigo, mas deixou os ouvidos trabalharem em qualquer movimento vindo das escadas.
- Cê tem noção de como foi difícil entrar aqui com duas catanas, passar por todo aquele lixo... pra no fim nem falar com o cara? – O rapaz por trás da carranca começou seu desabafo irado, mesmo sem mexer a boca, congelada naquele eterno sorriso de dentes afiados.
- O que de tão importante você teria pra conversar com ele? É só mais um bicheiro ligado com o crime organizado. Esses têm de monte! – A garota respondeu, o examinando.
- O infeliz tinha um carregamento de coca dos grandes saindo da Sé hoje à noite, eu ia interrogar o cara pra descobrir onde era! – O rapaz retrucou, enfezado; e não para menos.
- Olha... que tal a gente esquecer isso e sair daqui? Que diferença faz esse carregamento de coca agora? – Ela desconversou, mas decidiu ali qual seria seu próximo passo. trabalhar para descobrir sobre o carregamento da Sé. – E sabe o que mais... É legal conhecer alguém do ramo logo de cara! “Rouxinol”. – Ela apresentou o nome do pequeno pássaro como seu codinome e abriu a janela. Já ia saltar para a laje vizinha, mas esperou para ver a resposta da carranca, que olhava para o relógio na parede marcando duas horas da manhã.
                 O rapaz olhou para ela, empoleirada no parapeito e respondeu – Da Yu.  Então virou as costas e foi em direção à porta, “Rouxinol” sorriu e saltou do edifício. Cansado, o jovem guardou seus pertences e as catanas, separadas; em uma mochila para violão e saiu da boate, ouvia sirenes atrás dele, mas só pensava em como sua garganta estava seca.

Ler - Capítulo I

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