Los Angeles de 2189 não
dorme. Na sacada de seu pequeno apartamento, Grigori Dreikov limpa sua pistola
Sig. Compacta .50; uma arma antiga, porém elegante. Não muito diferente de
tantas e tantas outras armas terráqueas. O homem aprendeu muito com as raças
extraterrestres, porém existem vícios que não podem ser superados, apenas
aperfeiçoados.
E assim, os projéteis terráqueos de polímero foram
substituídos por outros metais mais potentes e alienígenas, como a Diatita
Lunar e o Kranü Centauriano. A industria armamentista virou de ponta cabeça e
velhos esboços foram reaproveitados em novos conceitos. A necessidade do homem
de carregar metal com gatilho e culatra não cessaria por nada. Nem quando
descobriram que o conceito de arma de fogo não existia para diversas culturas
alienígenas.
Muitas raças absorveram uma modalidade fantástica e barata.
A concentração de magnetismo polarizado com plasma à temperaturas
incalculáveis, no que o ser humano primitivo chamaria de "arma de raio laser". Porém o conceito era aplicado à
cajados, maças; machados ou martelos. Aos olhos humanos, a contradição e a
dificuldade de alcançar o conceito mantinha projetos de armas do tipo à nível
militar ultrassecreto.
Para Grigori, isso era ótimo. Jamais gostou de confiar em
projéteis mágicos de gracejos alienígenas. O quadro holográfico do apartamento
flutuou até a sacada onde estava sentado, para lhe informar que a digital de um
visitante foi reconhecida no portão da frente do prédio. Uma conhecida que não
via há meses. Ele se levantou do banco alto da sacada e foi até a porta,
pressionando a mão contra um círculo vermelho na altura de onde estaria uma
fechadura.
Com seu toque, o círculo tornou-se verde e a porta deslizou
para o lado, para dentro da estrutura da parede; para revelar de seu outro
lado...
-
Gaya... Descobriu que eu tava vivo, foi? – Ele se afastou da
porta com um sorrisinho e virou as costas para ela, de volta à direção da sacada
nos fundos da sala de estar, aonde estava sentado.
- Eu
tô com um problema. Pode ser grande. – Os olhos púrpura se destacavam
como os de um felino, na penumbra do apartamento.
-
Ah, é? – Ele desdenhou.
- É. – Ela retrucou.
- Que foi? Não tá achando seus "cyber-bagulhos"? Aqui não tá. – Ele a provocou, sentando no sofá e apoiando os pés na
mesinha de centro da sala de estar.
- Vai se foder! Eu só tô aqui porque é
um trampo discreto e... e é de família, meio que... –
Ela meneou a cabeça e sentou no sofá.
Há 2 quilômetros do chão, o apartamento
era considerado ainda baixo para os padrões de vida aceitáveis. Haviam vias
magnéticas para os carros vários metros acima e ainda muitas a baixo do andar
daquela habitação. Os sons dos motores e dos gritos nas galerias e comércio
daquele nível da cidade penetravam os aposentos do apartamento. Bem como os
diversos letreiros e neons dos flutuantes coletivos, a evolução do transporte
público. Vagões únicos com propulsão antigravidade que viajavam nos intervalos
de pistas magnéticas, matando o trânsito.
- Pra um cara bem de grana, tá foda
aqui. – Galyantra comentou, se afundando no encosto do sofá.
- Você sabe pra onde a grana vai, não
finge que não sabe. – Ele comentou, tirando o tapa-olho e permitindo que um flash de luz arroxeada, vinda de seu olho
esquerdo, inunda-se momentaneamente a sala de estar. Quando tudo voltou a
penumbra, a órbita negra e o círculo roxo que era a íris biônica, focalizaram a
jovem mulher.
A visão do olho aprimorado involuntariamente
ofuscava o entendimento do olho direito, humano. Em uma espécie útil de
estrabismo; manter o implante sob o tapa-olho era a maneira que Grigori encontrou
de "enxergar menos". Podia ver as sinuosas camadas de calor se
moverem pelo corpo da moça, bem como os poros de sua pele ao mero comando de
suas sinapses. Distinguiu a trilha esfumaçada de perfume dela no ar, que a seguiu da porta ao sofá. Observou a pistola Walter presa a cocha dela, por debaixo
da calça baggy de camurça.
- Eu devo isso à ela. Eu sei que a
reação dela não vai ser diferente do resto da família. Mas, eu devo isso à ela.
– Grigori comentou, fitando a cidade para além da varanda.
- Você se culpa demais. Tá, escuta... Se
me ajudar, eu descolo uma contribuição pros fundos da Illyana. –
Gaya se aproximou dele no sofá, transparecendo sinceridade.
- Eu enxergo a movimentação no seu pericárdio,
enxergo todo o resto também. Você não tem nem certeza se me contar que tem um
problema é a coisa certa, por que tá mentindo pra mim? –
Ele fixou fundo os olhos púrpura dela, concentrando-se para reter sua visão em
ambos os nervos ópticos e normaliza-la.
Sabendo que se entregou, se
convencendo de que ter abordado o jovem homem daquela maneira era errada; Ela
então expôs da melhor forma possível, sua linha de pensamento.
- Lembra
da filha do Joseph? – Ela perguntou?
- Joseph...
Joe Allen? O que aconteceu com ele e a esposa foi uma tragédia. –
Ele respondeu.
-
Pois é, nem todo mundo morre de um jeito bacana... –
Ela tentou prosseguir.
- O
quê? fatiados em moléculas em um dispersor sônico? –
Ele a interrompeu, Gaya piscou os belos olhos felinos, revirando-os. Grigori
sorriu, ao perceber que a deixava irritadiça.
- A filha do Joe manteve contato comigo nesses últimos anos, tava
morando com o tio até ser contratada como estagiária pela TAG Tech. – Foi a
vez dela notar que o deixara encabulado, e sorrir quando ele se remexeu no sofá
incomodado.
-
Não tinha lugar pior, não? – Ele comentou secamente, aproveitando
isso a moça explorou a ferida que compartilhava.
- Ela teve acesso ao mais novo Mímico deles. – Ela informou sem
muita euforia.
- Filho da puta! E todo mundo crente que essa história de humanoide
híbrido tinha passado. – Ele aparou a cabeça entre as mãos, apoiando os
cotovelos no joelho. Galyantra bocejou, e depois de alguns instantes no
silêncio do breu total, amenizado pelas luzes da cidade varando a sacada; ela
se pôs a falar.
-
Ela disse que ele é um cara legal... – Gaya é interrompida por um
grunhido de descrença de Grigori – ...
Que não tem noção de quem é ou o que faz.
- E
você vai entrar nessa? – ele perguntou avaliando-a.
-
Porra, Greggie... É a filha do Joseph. Se aquele cara não tivesse aparecido
provavelmente seríamos eu e você naquele dispersor sônico! –
Gaya se sobressaltou, erguendo-se do sofá em um salto e postando-se à frente
dele.
Grigori virou a cabeça e fitou novamente a cidade além da
varanda, haviam pessoas naquela vida com quem ele se identificava e devia para.
Colegas como o Major Stewart, Aleksandra e Gaya. Outrora Joseph Allen e sua
esposa Maddie faziam parte desse grupo, o ajudaram a encontrar direção quando
lhe faltava, assim como Galyantra o fez. Talvez ela tivesse razão, talvez
devesse isso à Laura Allen.
-
Vou ligar pro Stewart, e amanhã de manhã te encontro lá... Se quiser tem
colchão sobrando aqui. – Ele acrescentou levantando-se do sofá.
Ela dirigia-se à porta da frente.
-
Não dessa vez. – Ela sorriu, seus olhos hipnotizantes desaparecendo ao fechar da
porta deslizante do apartamento.
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